agosto 2013


Mostre os dentes!
Eles estão na praça
para te julgar
pelos dentes

tua distância na manhã
é eterna, e te persigo
sem braços

teus olhos encabulam
um qualquer amanhecer
que já não posso ver

tua voz ressoa
lembrança de manhã fugidia
que não foge

a pele, o deitar, o despertar
tudo na memória
e eu, já sem olhos

para outro viver

A noite guarda sonhos. Em pequenas caixas. A noite ensaia passos. Em curtas salas. Ilumina solidões. Encarece o tempo. Permeia o medo. A noite vence a alma. Cidade exposta. Trama de ilusões. Um cão demarcando território. Manhã: fedentina.

teu corpo
vela
tua alma
chama

Você se dá uma chance.
Você descobre coisas
que gosta,
que te ocupam,
que te levam pra longe.

O tempo parece curto.
Você descobre livros,
temas, músicas, trabalho.
Cheiros e lugares.

O tempo parece curto.
Você sente saudades,
você enruga,
faz careta no espelho.

O tempo parece curto.
De repente trinta,
Um caminho sem passos.
Todo salteado.

O tempo parece curto.
Tem tinta em suas mãos,
em sua camisa,
e isso não importa muito.

O tempo parece curto.
Você sorri sozinho,
caminha na rua,
sem motivos.

O tempo parece curto.
Pílulas para dormir,
teorias para viver,
nada faz sentido.

O tempo parece curto.
Você se reencontra,
vinte anos depois,
sem se dar conta.

O tempo parece curto.
E você ainda o conta.

decidiu transpor. transpor portas. ruas. estradas. cidades. territórios. tempo. transpor horas. dias. semanas. alcançar uma nova vida. decidiu se impor. e para quê? para cometer todos os mesmos erros. todos os mesmos passos. em outras calçadas. em outros dias. em outras noites. em um qualquer lugar.

transitava. só. alma vazia. entre a lucidez e a loucura. os olhos fundos. o riso histriônico. o grito entredentes. ia e vinha. passo ébrio. cambaleante. entre dia e noite. sem momentos. afundado em pensamentos. em contemplações. em notas e paixões. vazias. criadas. inventadas. ocultas. o álcool. o fumo. o riso. o choro. a lassidão. só. erguia paredes. barreiras. criava uma nova língua. uma nova teoria. trancava a noite numa garrafa. o dia num quarto. escuro. incompreendido. incompreensível. ardia no frio. congelava no verão. não via e via. olhos abertos. mente cerrada. dividia-se. lutava-se. vencia-se. e perdia-se.

a escrita
para libertar o grito preso
ou para aprisionar a palavra solta

se vermelhas rolavam as lágrimas
escurecidas se mostravam as almas
em redor, ninguém acudia

as lágrimas, vermelhas, pousadas
não sensibilizavam
antes causavam asco, angústia

eram lágrimas sem causa
sem lugar, sem acolhida
como fruta apodrecida

aos olhos chorados
em vermelho pranto
o surdo abandono